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Brasil: Abre os olhos, turista!

Como é bom voltar das férias, abrir a mala cheia de lembranças e distribuir os presentes entre os parentes que já estão babando ávidos. Um lugar muito agradável para comprar aqueles presentes é a cidade de Embu das Artes, uma meia hora de carro de São Paulo. Quase não se vê turistas por aqui, mas muitos paulistanos. Mas como nos lugares bem turísticos, onde se paga caro para comprar coisas sem valor, é preciso tomar cuidado. Então, abre os olhos na hora da compra!

Por que não interpretei aquele acontecimento como um aviso? Calma, me explico melhor: Aquele dente de jacaré que comprei de lembrança na selva amazônica e que foi, segundo as informações dadas, tirado na noite anterior da boca do gigante morto, quebrou logo no caminho para casa.

Bom, se foi por coincidência que justamente aquele jacaré estava com cáries ou se os dentes de jacarés são, ao contrário do que se imagina, geralmente bem finos e frágeis, não consegui descobrir. Mas, de qualquer maneira, deveria ter sido um aviso para ser mais crítico ao comprar lembranças no Brasil.

Ainda me lembro, de forma dolorosa, do vendedor ambulante numa praia, que, com muitos gestos, me assegurou que aquele anel que acabei de comprar era um anel muito especial, o único exemplar com motivos misteriosos e míticos dos índios, feito num lugar perto daquela praia. Com muito orgulho, andei contando essa história para todo mundo, até encontrar, no interior da Alemanha, uma pessoa com exatamente o mesmo anel, comprado numa loja de jóias baratas. Impressionante até onde chega o braço misterioso-mítico dos índios.

Na época, também me ofereceram "pedras preciosas de verdade". Estava deitado ao lado da piscina do hotel, quando um homem de óculos escuros chegou perto e sussurrou que estava com pressa de vender essas pedras de alta qualidade.

Para reforçar sua messagem, olhou para os lados como se alguém perigoso estivesse atrás dele. Claro que não comprei nada, sou esperto demais para não cair numa dessas. Agora, anos depois, elas estão novamente na minha frente, brilhando em todas as cores, "pedras preciosas", como a vendedora jura para mim.

As ruas de Embu estão cheias de gente. Como em todos os domingos, massas de fugitivos de fim-de-semana que fogem de São Paulo - cidade de vinte e dois milhões de pessoas - para passear no pequeno centro histórico de Embu.

Impressionante como os paulistanos sempre conseguem entupir o lugar para onde eles vão! Os músicos de rua fazem a trilha sonora para essa festa colorida, e os vira-latas latindo, como também as baianas oferecendo comida. Acarajé, camarão grelhado, caldo-de-cana, latas de cerveja.

"Tão colorido por aqui, tão bonitinho!" Um vendedor de pedras da Alemanha encomendou seis quilos de pedras preciosas. Ele disse que dá para vendê-las nas feiras de natal. Bom, melhor levar doze quilos. Tudo o que o coração pede se acha em Embu: talhas de madeira para a sala-de-estar, guarnições de ferro para o jardim, "pufs" para sentar em frente da televisão, suporte de vela para os encontros românticos, quadros bem cafonas com índios semi-nus de enlouquecer, estantes antigas para quem gosta de livros... E as inevitáveis redes.

Mas aquelas do nordeste são muito mais lindas do que as daqui, do sudeste brasileiro. Não têm aquelas varandas de renda e padrões finos coloridos.

Como a de vermelho-azul, que comprei em Fortaleza e na qual balancei pelas tardes, até a filha da dona da minha casa se deitar nela para mamar. De tanto balançar, o nenê vomitou o leite de volta na minha rede. E como a fralda da criatura esvaziou, minha rede se transformou num pano manchado e fedorento. Só me restou colocá-la na máquina de lavar. Desde então, ela está inteiramente lilás.

Um cabeludo quase sem dentes escreve com uma faca meu nome num chaveiro feito de um pedacinho de madeira. Tenho que escrever meu nome três vezes, em papéis diferentes, para ele entender como soletrá-lo, para depois colocá-lo na madeira. Enquanto isso, ando um pouco pelo centro de Embu. Almofadas coloridas, velas enfeitadas e roupa brilhante. Os jesuítas fundaram Embu em 1554. Na época, a cidade foi batizada Bohi. Mais tarde se transformou em M`Boy e depois em Embu. No fim dos anos sessenta hippies começaram a vender artesanatos, a partir de 1969 a cidade se transforma numa feira colorida para coisas que ninguém precisa, mas que dá um design agradável para sua vida. Como o negócio para pendurar a chave, que já está pronto. Apesar de tudo, o nome está escrito errado.

Mas esses pequenos fracassos não conseguem arruinar um dia de tantos sucessos. Consegui baixar os preços, os sacos cheios das pedras mais preciosas do Brasil.

No caminho de volta para a Alemanha quase morri de tanto carregar (oitenta quilos), as malas cheias de uma mesa feitas de galhos, inclusive um suporte de ferro, lápis coloridos, velas cheirosas e uma rede enorme para toda família. Mas tudo isso já tinha esquecido ao entrar naquela loja no interior da Alemanha.

"Aqui seus seis quilos, como você tinha encomendado. Se quizer mais, tenho bastante no carro." De cara aflita, o vendedor abre uma sacola de pedras. "São todas tingidas," fala, "são pedras quaisquer, colocadas numa tinta ou num ácido. Ou no forno com alta temperatura, para que elas mudem a cor. Não posso vendê-las de jeito nemhum!" Não me consolo, pois pouco depois encontro pedras como as minhas numa loja de jóias baratíssimas. Mas, pelo menos, não sou o único que caiu nessa.

Que as pedras nesta loja custam o mesmo que no Brasil, me dá bastante raiva. E assim chamo a vendedora e pergunto a ela, francamente, de forma bem inocente: "Com certeza você sabia que essas pedras, para ficarem nessa cor, foram expostas a uma alta radiação. Não sabia?"

Texto + Fotos: Thomas Milz print version  

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