[art_4] Brasil: Maquiné e a economia de palavras
Peter Lund e a gruta magnífica

"Parece fundo..." O guia aponta a lanterninha para a água. Os olhos, atrás dos óculos, tão abertos como se estivesse assistindo a um filme de suspense. E quase sussurando, completa a frase: "...mas nada ver."

Mineiros não falam muito, comenta-se no Brasil. Mas não é bem isso. É que ele está economizando suas palavras. Quem sabe, talvez tenha lido uma matéria sobre quantas palavras cada ser humano fala durante a vida, e, de repente, tivesse chegado à conclusão de que se economizasse um monte delas durante cada dia, sua vida se prolongasse automaticamente.

"Ele deve ter feito esse passeio já umas mil vezes, e cansou de falar frases completas", chuta um da nossa turma.

E como se ele tivesse ouvido tal comentário, o guia bate na sua barriguinha. "Tempertura alta, humidade do ar, caminhar na gruta mantem a forma!"

Seguimos pelas sete salas enormes da gruta, com uma extensão total de mais de 200 metros, ligadas por mais 440 metros de túneis. A iluminação elétrica e colorida cria um cenário irreal, magnífico e, às vezes, até assustador nos cantos. "Agora  pouca água!" O chão lisinho, exigindo o maior cuidado para não escorregamos. De vez em quando, há buracos redondos, nos quais o guia enfia a lanterninha. "Água desce por aqui", explica ele, sorrindo. "Crianças já descerem, mas não chegaram no fundo. Estreitos demais!" Ele sorri para nós. "Parece um buraco pequeno... mas nada ver!"

Somos os únicos turistas na gruta, e aproveitamos para testar o eco, gritando qualquer bobagem. "Sogra com barba...", explica o guia, apontando com a luz para uma rocha no teto. "Até Deus castiga sogra!" Ele está rindo da própria piada. De todos os lados há estalactites e estalagmites, criadas pela água que desce pelas rochas calcárias.

Chagamos na sala principal. O espetáculo é de tirar o fólego. A Gruta do Maquiné é considerada uma das mais bonitas do mundo. Quem tiver o privilégio de vistitá-la, vai entender o porquê.

"Quanto a mim, confesso que nunca meus olhos viram nada de mais belo e magnífico, nos domínios da natureza e da arte." Foi assim que o dinamarquês Peter Wilhelm Lund descreveu as belezas da gruta.

O cientista chegou aqui em 1836 durante sua expedição para cartografar as grutas em Minas Gerais. Diz a lenda que ele até dormiu na gruta. "Cama de Lund!" O guia mostra um cantinho que parece feito para dormir. Quem sabe...

A Gruta de Maquiné foi descoberta 11 anos antes da chegada de Lund, pelo dono das terras, Joaquim Maria do Maquiné. Mas só através das publicações do estudioso dinamarquês, foi que o mundo ficou sabendo da sua existência. Lund registrou, acompanhado de uma equipe de cientistas europeus, um total de 106 grutas ao longo do Rio das Velhas, em Minas Gerais.

As salas da gruta foram cravadas pelas águas do Ribeirão do Onça, que faz parte do sistema fluvial do Rio das Velhas. Um trabalho de milhares e milhões de anos, e até hoje ninguém sabe até onde a gruta realmente vai.

Há uma pequena abertura na parede, nos fundos da sala principal. "Vai até Brasília... talvez", brinca o guia. Mas avançar mais gruta adentro não é permitido. "Gases! Perigo de explosão!! Asfixia!!!"

Voltamos. Há algumas pedras quebradas e sujas. "Tocar é proibido", avisa o guia. Mas dá para perceber que durante quase cem anos de turismo na gruta, muitos não seguiram tal aviso. "Quebram e levam pra casa", ele lamenta. "Mentalidade curta!"

Ele vira e segue para a saída da gruta, uma pequena abertura na rocha. Por isso a gruta foi descoberta apenas 180 anos atrás. De fora, parece apenas um buraco na pedra. Mas nada ver!

Info
A Gruta do Maquiné é localizada perto da cidade de Cordisburgo, em Minas Gerais. Acesso pela BR 40, de Belo Horizonte para Brasília, a uma distância de 120 quilômetros da capital mineira.

Texto + Fotos: Thomas Milz