[art_4] Brasil: Marquinhos e o Trem do Samba
Tentativas de resgate

O bairro carioca Oswaldo Cruz divide o destino da maioria dos bairros da periferia da "cidade maravilhosa", como Rio de Janeiro se auto-nomeia. Altos índices de desemprego e violência - coisa conhecida nos bairros pobres brasileiros. Uma parte esquecida do Rio, longe dos cartões-postais da Zona Sul, do Rio de Janeiro das clases brancas, das praias de Ipanema, Leblon e Copacabana com seus hoteis caros, um dos palcos principais do turismo global.

marquinhos de oswaldo cruz

Poucas coisas ainda lembram dos tempos passados, quando Oswaldo Cruz fez suas contribuições para a cultura brasileira. "Uns dos maiores e mais importantes compositores do samba nasceram aqui, e o bairro era um centro das escolas de samba da cidade", conta Marcos Sampaio de Alcântara, músico que nasceu e cresceu em Oswaldo Cruz, e conhecido no Rio sob o nome de Marquinhos de Oswaldo Cruz.

Desde o começo dos anos noventa, Marquinhos se esforça para devolver ao seu bairro natal um pouco da auto-estima e da esperança perdida. Naquela época, andava de perua pelas ruas do bairro, distribuindo, ao som de um samba, panfletos: "Acorda Oswaldo Cruz!". "Se você tivesse tirado a placa de "OSWALDO CRUZ" ao lado dos trilhos do trem, tudo mundo teria esquecido que o bairro existia."

Marquinhos possui uma certa experiência em acordar bairros adormecidos. Dez anos atrás, começou a se dedicar ao bairro da Lapa, conhecido por seu arco branco, por onde até hoje o último bonde da cidade sobe para Santa Teresa.

Com o apoio de outros sambistas, Marquinhos botou o samba de volta nas ruas da Lapa. Hoje o bairro é a melhor opção para quem quer curtir música ao vivo no Rio.

Para ajudar Osaldo Cruz e botar o bairro de volta aos mapas da cidade, Marquinhos realizou um outro feito. No dia 2 de Dezembro, o Dia Nacional do Samba, ele organiza, pela décima vez, o "Trem do Samba". Cinco trens cheios de rodas de samba e gente dançando e curtindo deixam a "Central do Brasil" em direção ao Oswaldo Cruz. Durante os quarenta minutos de viagem, o povo dança e canta junto, até chegar na estação onde se juntam às cem mil pessoas, que acompanham o espetáculo.

"Os trens da periferia simbolizam, na história do Rio, a marginalização dos afro-descendentes," conta Marquinhos. "Rio era para ser uma cidade moderna, seguindo o modelo europeu de desenvolvimento.

E nesse conceito não tinha espaço para os afro-descendentes, os filhos dos antigos escravos." Desde o início do século XX, a população "negra" foi empurrada para longe do centro. Uns construiram um novo lar nos morros da cidade, onde seus descendentes vivem até hoje, nos bairros chamados de "favelas".

Marquinhos conta desse processo no seu novo disco, que será lançado no começo de dezembro. "Memórias de Minh`Alma" é o título, que conta com a contribuição de alguns dos melhores sambistas cariocas. O disco canta a vida dos esquecidos nesta cidade inesquecível, desde os tempos da escravidão; chegando aos dias de hoje, com sua marginalização geográfica e social.

Centenas de milhares de pessoas se enfiam nos trens da periferia; faxineiras, vendedores, cabeleireiras e babás deixam seus bairros todas as manhãs para ir trabalhar no Rio "rico". "A estação de trem Oswaldo Cruz sempre foi a única saída para quem quis fugir da falta de esperança neste bairro."

O Trem do Samba pega a direção oposta. "A periferia sumiu dos mapas da cidade. O carnaval se transformou numa festa para os turistas, com uma participação cada vez menor da população periférica.

Vamos dar um sinal para mudar isso." Marquinhos acredita que possa devolver ao povo de Oswaldo Cruz uma parte da própria cultura: o samba. E, com ele, um pouco de auto-estima e esperança.

Texto + Foto: Thomas Milz