[art_2] Brasil: Lula vai para a prorrogação

Houve uma época em que Luiz Inácio Lula da Silva era contra a possibilidade de que um presidente pudesse ser reeleito para um segundo mandato. Um mandato é suficiente, diziam Lula e seus companheiros petistas em 1998, quando o então presidente Fernando Henrique Cardoso mudou a constituição emendando um segundo mandato. Mas, na época, o próprio Lula estava com pressa de se tornar presidente.

Agora, presidente há quase quatro anos, Lula foi levado por 58 milhões de votos para seu segundo mandato de mais quatro anos.

"Vamos fazer um segundo mandato muito melhor do que fizemos o primeiro, muito melhor", Lula prometeu no seu primero discurso como presidente reeleito, na noite do dia 29 de outubro, num hotel em São Paulo.

Foi surpreendente que o presidente não venceu já no primeiro turno, no dia 01 de outubro. Alcançou quase 49% dos votos válidos, enquanto seu adversário Geraldo Alckmin, visto como pessoa sem nenhum carisma, chegou a surpreendentes 42%.

Lula tinha pisado na bola. Tinha certeza absoluta de levar a vitória já logo no primeiro turno. Por isso, não apareceu ao último debate entre os candidatos, o que foi visto como ato de desprezo e arrogância. E quando, na véspera da eleição, apareceram as imagens do dinheiro apreendido pela polícia no caso do dossiê, o cenário mudou. O dossiê-gate, escândalo em que petistas tentaram comprar um dossiê com provas de corrupção contra Geraldo Alckmin, diminuiu as chances de Lula de ganhar logo no primeiro turno. O país "ganhou" mais quatro semanas de campanha eleitoral, custando a Lula um visível desgaste físico.



Mas Lula finalmente tinha acordado, viu o perigo e começou a lutar. Nos quatro debates com Alckmin, ele mostrou sua superioridade retórica. Fez, como em 2002, o papel de "Lula paz e amor". E Alckmin? Caiu nas armadilhas de Lula, que chamou o tucano de neoliberalista e alegou que ele queria privatizar as estatais, como a Petrobrás e o Banco do Brasil. O médico de Pindamonhangaba não soube reagir, deixando Lula crescer tanto que, no dia do segundo turno, o petista chegou 20 milhões de votos na frente de Alckmin.

Agora, Lula se mostra cheio de vontade. Disse que aprendeu com os erros do primeiro mandato, e que agora chegou a hora de acelerar, de andar a 120 quilômetros por hora, ao invés dos 80 do primeiro mandato. "Agora conhecemos o caminho, e fazemos como o Felipe Massa!" Prometeu, no seu primeiro discurso como presidente reeleito, mais agilidade - "uma decisão tomada na minha mesa não pode ficar mais do que 30 dias sem estar regulamentada."

E logo depois, Lula já desembarcou na festa petista na Avenida Paulista. Não tinha mais que cinco mil pessoas - número decepcionante para quem se lembra daquela noite quatro anos atrás, quando cem mil pessoas festejaram a primeira vitória de Lula, transformando a Paulista num salão de festa. Agora, há um tom melancólico no ar. Pouco lembra dos tempos de luta de classe.

"A vitória não é de Lula, não é do PT... a vitória é, eminentimente, da sabedoria do povo brasileiro", diz um aparentemente cansado e desgastado Lula.

Dois anos de escândalos deixaram suas marcas no PT. Começou com o escândalo da máfia do bingo, do mensalão, da compra de parlamentares e do desvio de dinheiro público. "Não sei se Lula sabia disso, ou se ele participou nisso. Mas isso não é a questão - a política social dele não pode parar. Por isso, Lula teve que ganhar." Muitos petistas pensam como essa ativista paulistana.

Mas há pessoas que acham que os escândalos não passam de puras invenções da mídia e da oposição. Há uma faixa enorme na Avenida Paulista: "O povo venceu a mídia!"



Um cinquentão sabe que Lula foi vítima dos Estados Unidos. "Foi a CIA que armou tudo isso. Como parte de um plano continental para acabar com Hugo Chávez. E quem está atrás de tudo isso? A Condoleezza Rice."

"Deixa o homem trabalhar", gritaram os petistas na Avenida Paulista. Parece que Lula os ouviu. Depois de um rápido discurso, desce do palco. "Não temos tempo a perder", o velho-novo presidente disse, entrou no seu carrão blindado e foi embora.

Ficaram apenas as pessoas muito a fim de dançar mais um pouquinho. Um samba voava pelos ares da Paulista, tinha até batuque na escuridão da noite paulistana. Algumas pessoas ergueram suas bandeiras para o céu, enquanto um grupo de sem-tetos dormia tranquilo, em plena muvuca, em frente de uma farmácia.

Texto + Fotos: Thomas Milz