ed 01/2010 : caiman.de

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[art_1] Brasil: Lula verde
 
Muitos ficaram perplexos. Em algum momento no final do ano 2009, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tinha se transformado, de repente, no líder do movimento verde, prestes a salvar o clima global. Para aqueles que acompanharam a trajetória ambiental do governo Lula (se realmente da para falar de uma trajetória verde...) foi uma surpresa enorme. Claro que Lula entende de política como ninguém, que sempre percebe por onde anda o Zeitgeist. E com todo este hype em torno da conferencia de Copenhague surgiu, no mundo inteiro, a palavra mágica do “Desenvolvimento Sustentável”, formula para solucionar quase todos os problemas da humanidade. E com o qual se pode vender, no palco mundial, até projetos de hidroelétricas como investimentos na proteção ambiental.

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Claro que tudo isso não é uma idéia nova. A final das coisas, há movimentos verdes na Europa desde o final dos anos 70, e muitas ONGs têm lutado há anos pela sobrevivência dos diversos biomas no Brasil. Mas a questão ainda não havia chegado, até então, na elite política brasileira. Entretanto, em meados de novembro, Lula começou sua ofensiva diplomática com uma coletiva durante a reunião sobre segurança alimentar em Roma. “O que vocês pensam porque o Brasil tomou a iniciativa de apresentar números?” Lula perguntou aos jornalistas. “É para a gente poder cobrar daqueles que passam o tempo inteiro querendo dar lições ao Brasil.”

Poucos dias antes, Lula havia estabelecido um plano para reduzir as emissões de gases de efeito estufa do Brasil. Quase 40% seriam cortadas até 2020, principalmente com a redução do desmatamento em 80% até aquele mesmo ano. Os ambientalistas têm lutado muito para que o governo do Brasil apresentasse um compromisso voluntário de redução das emissões de CO2. Como país do Anexo II do Protocolo de Quioto, o Brasil poderia ter continuado a emitir a vontade, sem nenhuma restrição. Mas, aparentemente, Lula desfruta de seu novo papel de liderança para salvar o meio ambiente global. E, com este papel, ele também apareceu na conferência do clima em Copenhague. Embora fosse conhecido anteriormente como defensor dos países pobres em desenvolvimento do hemisfério sul e de uma política comercial mais justa, nunca tinha agido como um político verde. Dada a atuação decepcionante de outros líderes políticos em Copenhague, tem de simplesmente pagar respeito por seu esforço. Não importa quais os motivos por trás disso.

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No Brasil, ele sempre foi muito criticado pela política ambiental durante os sete anos de seu mandato. O crescimento econômico a qualquer custo, a forte ênfase na expansão da agricultura mesmo nos biomas ameaçados, como a Floresta Amazônica e o Cerrado, a expansão irresponsável de infra-estrutura para servir à política de exportação e projetos de hidroelétricas controversas para alimentar a fome energética das indústrias. Sem esquecer que o governo revogou uma lei de estabelecer o rígido padrão europeu de diesel – fato que faz com que os brasileiros continuam a respirar os gases de diesel mais sujos do mundo.

Esgotada pelas intermináveis lutas dentro do governo e contra os outros ministros, Marina Silva, até então ministra de meio ambiente, jogou a toalha. Considerada por muitos como "álibi verde de Lula", Marina deixou o governo no início de 2008. A última gota pode ter sido a decisão de Lula de deixar o liberal professor de Harvard Mangabeira Unger desenvolver um plano de desenvolvimento a longo prazo para a região amazônica. A Amazônia é, afinal, não é um santuário que deve permanecer intocado, disse Lula na ocasião. As pessoas que vivem na região teriam, segundo Lula, o mesmo direito de usufruir das bênçãos da vida moderna como todos os outros povos do planeta. Agora, novas estradas estão prestes a serem cortadas pela floresta e enormes hidroelétricas vão produzir eletricidade para milhões de pessoas (e umas poucas fabricas multinacionais de alumínio no Pará).

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Quem sabe Marina Silva tenha percebido que teria mais chances de conseguir avanços para o meio ambiente fora do governo do que dentro... Em meados de 2009 ela chocou seu partido, o PT de Lula, com sua decisão de se juntar ao Partido Verde. E em agosto anunciou seu plano de ser candidata pelos Verdes nas eleições presidenciais de 2010.
A noticia sacudiu o Brasil e, principalmente, o PT. Para muitos, Marina Silva é uma das ultimas pessoas autênticas da política brasileira, uma figura quase mítica com uma história pessoal quase tão comovente como a do próprio Lula, que cresceu em condições precárias no nordeste brasileiro. Criada na selva amazônica, filha de uma família de seringueiros, resgatada por freiras quando estava sofrendo de hepatite, ativista da Igreja Católica e companheira de luta de Chico Mendes - isto é Marina Silva.

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No PT de Lula soou o alarme máximo. A candidata de Lula, Dilma Rousseff, chefe da casa civil e aparentemente obrigada por Lula a ser a candidata do PT, andava mal nas pesquisas. Ela não tinha nada de verde, alem de uns vestidos. Até 50% dos eleitores tradicionais do PT poderiam optar por Marina Silva, alertaram as pesquisas de opinião pública. Foi neste momento que, de repente, até a imprensa descobriu o meio ambiente como tema de destaque numa futura disputa eleitoral. Desde que Marina Silva anunciou, em agosto, a idéia de se candidatar, os principais jornais do Brasil já saíram varias vezes com assuntos ligados ao meio-ambiente como destaque da primeira pagina. Coisa rara nos tempos anteriores. Assim, Dilma passou a falar muito sobre o meio ambiente para se tornar mais verde. Até liderou a delegação brasileira em Copenhague. A onda verde chegou, finalmente, na política brasileira. Agora é só esperar o discurso virar política real. Ou se foi tudo apenas para dinamarquês ver.

Texto + Fotos: Thomas Milz

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